Parecer

Home Conteúdos Técnicos Parecer

24/05/2023

Suplementação de Creatina para Crianças e Adolescentes

PARECER TÉCNICO Nº 01/2023


ASSUNTO: SUPLEMENTAÇÃO DE CREATINA PARA CRIANÇAS E ADOLESCENTES


A creatina (ácido metilguanidina-acético) é um composto nitrogenado que pode
ser produzida endogenamente — a partir dos aminoácidos arginina, glicina e metionina
nos rins e no fígado — ou obtida por meio da alimentação, tendo como principais fontes
as carnes bovinas e os peixes. A maior parte da creatina do corpo humano está
armazenada no músculo esquelético (95%) na forma de fosfocreatina; assim, ligada a uma
molécula de fosfato, que é liberada via ação da enzima creatina quinase para formação de
adenosina trifosfato (ATP), especialmente, em exercícios físicos de elevada intensidade.
Estudos que avaliaram o efeito da suplementação de creatina mostraram efeitos positivos,
principalmente, em adultos submetidos a exercícios físicos de alta intensidade, que
requerem força e potência muscular. Além disso, alguns estudos tiveram como objetivo
avaliar o efeito da suplementação de creatina sobre condições fisiopatológicas, como a
sarcopenia, sugerindo resultados positivos (p. ex., aumento de força e massa muscular)
para população idosa ao longo do tempo. Nos adultos, a suplementação de creatina
aumenta de 10 a 40% a sua concentração muscular, dependendo dos níveis de
fosfocreatina pré-suplementação, geralmente influenciados pelo padrão alimentar (p. ex.,
vegetarianos, onívoros etc.) (CHOI; KIM; BAE, 2021; GIELEN; BECKWEE;
DELAERE; DE BREUCKER et al., 2021; NORTHEAST; CLIFFORD, 2021; STARES;
BAINS, 2020).
Tendo em vista o entendimento do uso potencialmente descomedido e equivocado
de creatina às crianças e adolescentes, a Associação Brasileira de Nutrição Esportiva
(ABNE) publica este parecer com intuito de ampliar o entendimento dos efeitos deste
suplemento nesta população.

CONSIDERANDO:
1 – Crianças e adolescentes, em diferentes condições clínicas, parecem responder
positivamente à suplementação de creatina no que se refere o aumento de fosfocreatina
muscular (SOLIS; ARTIOLI; OTADUY; LEITE et al., 2017);
2 – Crianças apresentam menor estoque de creatina muscular comparativamente aos
adultos; entretanto, parecem aumentar as concentrações de fosfocreatina no músculo
esquelético após a suplementação de maneira superior em comparação aos adultos
(SOLIS; ARTIOLI; OTADUY; LEITE et al., 2017);
3 - As evidências científicas sobre a creatina foram produzidas, sobretudo, em pessoas
adultas e idosas; logo, pouco se sabe sobre os seus efeitos em outras populações, como
as crianças e os adolescentes (NORTHEAST; CLIFFORD, 2021; STARES; BAINS,
2020);
4 - Em adolescentes praticantes de futebol e natação, os estudos que avaliaram os efeitos
da suplementação de creatina não relataram efeitos colaterais (JAGIM; STECKER;
HARTY; ERICKSON et al., 2018; JAGIM, KERKSICK, 2021. ). Apesar destes estudos,
as evidências são escassas e, por isso, novas pesquisas são necessárias em outras
modalidades, bem como em atletas crianças e adolescentes do sexo feminino.
5 - A suplementação em crianças e adolescentes também tem sido estudada para as
desordens genéticas associadas a creatina, como erros inatos do metabolismo, disfunções
neuromusculares e miopatias (HAYASHI; SOLIS; SAPIENZA; OTADUY et al., 2014;
SAKELLARIS; KOTSIOU; TAMIOLAKI; KALOSTOS et al., 2006;
TARNOPOLSKY; MAHONEY; VAJSAR; RODRIGUEZ et al., 2004).

PARECER:
Apesar da escassez de ensaios clínicos randomizados duplo-cego e controlados
por placebo conduzidos com crianças e adolescentes, o uso neste público é crescente.
Considerando os estudos em indivíduos adultos e alguns estudos em crianças e
adolescentes, a creatina parece ser segura. Todavia, não há estudos que avaliaram a
segurança do uso em crianças e adolescentes e os autorrelatos de ausência de efeitos
colaterais não são suficientes para garantir ausência de efeitos negativos. Isto posto, é
necessário refletir a respeito da insuficiência de estudos robustos, bem controlados, para
garantir efeito positivo e segurança com a suplementação de creatina para essa população.
Àqueles que desejam prescrever a creatina para otimizar o aumento de massa muscular,
é fundamental garantir que outros fatores associados a hipertrofia muscular esquelética
devem estar organizados, como: (i) adequação da ingestão energética; (ii) adequação da
ingestão proteica.
Neste contexto, a necessidade de utilização da creatina deve ser avaliada por
profissionais nutricionistas e/ou médicos, em casos específicos de atletas adolescentes
competitivos ou nas disfunções neuromusculares e erros inatos do metabolismo, em
qualquer faixa etária. Em qualquer outra condição, como crianças e adolescentes que
praticam exercício físico recreativo ou crianças saudáveis, a suplementação de creatina
não é recomendada pela ausência de evidências científicas, notadamente, a partir de
ensaios clínicos bem conduzidos e com seguimento suficiente para avaliar potenciais
desdobramentos negativos.


BIBLIOGRAFIAS:
1. CHOI, M.; KIM, H.; BAE, J. Does the combination of resistance training and a
nutritional intervention have a synergic effect on muscle mass, strength, and physical
function in older adults? A systematic review and meta-analysis. BMC Geriatr, 21,
n. 1, p. 639, Nov 12 2021.

2. GIELEN, E.; BECKWEE, D.; DELAERE, A.; DE BREUCKER, S. et al. Nutritional
interventions to improve muscle mass, muscle strength, and physical performance in
older people: an umbrella review of systematic reviews and meta-analyses. Nutr Rev,
79, n. 2, p. 121-147, Jan 9 2021.
3. HAYASHI, A. P.; SOLIS, M. Y.; SAPIENZA, M. T.; OTADUY, M. C. et al. Efficacy
and safety of creatine supplementation in childhood-onset systemic lupus
erythematosus: a randomized, double-blind, placebo-controlled, crossover trial.
Lupus, 23, n. 14, p. 1500-1511, Dec 2014.
4. JAGIM AR, KERKSICK CM. Creatine Supplementation in Children and
Adolescents. Nutrients. 18; n.13, v.2, p. 664, Fev, 2021.
5. JAGIM, A. R.; STECKER, R. A.; HARTY, P. S.; ERICKSON, J. L. et al. Safety of
Creatine Supplementation in Active Adolescents and Youth: A Brief Review. Front
Nutr, 5, p. 115, 2018.
6. NORTHEAST, B.; CLIFFORD, T. The Effect of Creatine Supplementation on
Markers of Exercise-Induced Muscle Damage: A Systematic Review and Meta-
Analysis of Human Intervention Trials. Int J Sport Nutr Exerc Metab, 31, n. 3, p.
276-291, May 1 2021.
7. SAKELLARIS, G.; KOTSIOU, M.; TAMIOLAKI, M.; KALOSTOS, G. et al.
Prevention of complications related to traumatic brain injury in children and
adolescents with creatine administration: an open label randomized pilot study. J
Trauma, 61, n. 2, p. 322-329, Aug 2006.
8. SOLIS, M. Y.; ARTIOLI, G. G.; OTADUY, M. C. G.; LEITE, C. D. C. et al. Effect
of age, diet, and tissue type on PCr response to creatine supplementation. J Appl
Physiol (1985), 123, n. 2, p. 407-414, Aug 1 2017.
9. STARES, A.; BAINS, M. The Additive Effects of Creatine Supplementation and
Exercise Training in an Aging Population: A Systematic Review of Randomized
Controlled Trials. J Geriatr Phys Ther, 43, n. 2, p. 99-112, Apr/Jun 2020.
10. TARNOPOLSKY, M. A.; MAHONEY, D. J.; VAJSAR, J.; RODRIGUEZ, C. et al.
Creatine monohydrate enhances strength and body composition in Duchenne
muscular dystrophy. Neurology, 62, n. 10, p. 1771-1777, May 25 2004.


Compartilhe:  

  Voltar para a listagem