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16/11/2018

Efeito placebo na nutrição esportiva



Pedro Perim - Nutricionista, mestrando em ciências pela Faculdade de Medicina da USP, coordenador científico do Science Play
 


 

O efeito placebo vem sendo uma das áreas de pesquisa na nutrição mais relevantes para explicar principalmente, o efeito ergogênico de alguns suplementos. Embora as pesquisas sobre essa temática sejam recentes, o efeito placebo está presente em abundância no cotidiano da população. Por exemplo, quem nunca teve receio de encontrar um gato preto na rua e achar que seria sinônimo de más notícias.

Vale salientar que, diferente do que muitas pessoas acreditam, o efeito placebo não está associado a um resultado negativo à alguma intervenção, pelo contrário, o conceito do efeito placebo é um resultado positivo em resposta a uma substância inerte. Por outro lado, o efeito nocebo é conceituado como um resultado negativo à determinada intervenção. Portanto, o placebo é uma substância inerte, porém, o contexto psicosocial não, ou seja, a expectativa positiva criada a determina substância está associado com sua efetividade.

Uma exemplo disso é um clássico estudo conduzido por Beedie e colaboradores no qual alocou ciclistas treinados e três diferentes condições para realizarem um teste contra-relógio de 10km. Os voluntários realizaram o teste físico em situações nas quais eles acreditavam que era placebo, moderada dose de cafeína (4,5mg/kg) e alta dose de cafeína (9,0mg/kg). Os resultados mostraram que os indivíduos que realizaram o teste na condição placebo tiveram uma ligeira redução de rendimento, enquanto o grupo que performou o teste na condição de moderada dose de cafeína teve um moderado aumento de desempenho, porém, o maior aumento de performance foi observado nos voluntários que acreditavam que estavam ingerindo uma dose elevada de cafeína. Mas, o mais curioso desse estudo é que todos os indivíduos receberam placebo nas três condições, em nenhum momento foi dado a suplementação de cafeína ou qualquer outra substância ativa. Concluindo, mais uma vez, que a expectativa criada a determinado suplemento está diretamente associado a sua efetividade.

Com o avançar da ciência, começou a investigar um outro modelo de placebo, conhecido como placebo aberto (do inglês open-label placebo ou placebo without deception). Esse modelo consiste basicamente na suplementação de placebo na qual tanto o pesquisador quanto o voluntário sabem que a substância suplementada é placebo, ou seja, uma substância inerte. Porém, é informado aos participantes que mesmo sendo uma substância inerte é capaz de gerar respostas fisiológicas associadas a melhora de saúde e rendimento físico. Alguns estudos prévios já mostram resultados positivos da suplementação de placebo aberto em algumas condições de saúde, como por exemplo, síndrome do intestino irritável, fadiga em resposta ao tratamento quimioterápico, rinite alérgica, dor nas costas, depressão, entre outros.

Recentemente, nosso grupo de pesquisa da Universidade de São Paulo buscou investigar se a administração de placebo aberto exerceria um papel ergogênico do desempenho esportivo. Para isso, convidamos ciclistas treinadas para realizar um teste físico de 1km contra-relógico em duas diferentes condições: placebo aberto e controle. Na condição placebo aberto, foi administrado duas cápsulas sem nenhum composto ativo e antes do exercício foi ministrado uma breve palestra para os voluntários mostrando que embora a substância seja inerte, diversos estudos já mostraram a força do placebo e que aquilo poderia melhorar o desempenho físico. Os resultados mostraram que o grupo suplementado com placebo aberto completou o teste de 1km em um tempo significativamente menor do que o grupo controle. Nossas principais conclusões são que embora a expectativa positiva tenha grande relevância para o funcionamento do placebo ela não é necessária. Apenas pelo fato de ingerir cápsulas (mesmo sendo inertes) o incentivo para a melhora do desempenho físico acontece automaticamente. Portanto, o efeito placebo explica a popularidade de inúmeras intervenções nutricionais na saúde e no esporte que não possuem eficácia comprovada pela literatura científica. Esse foi o primeiro estudo da história envolvendo a suplementação de placebo aberto com o esporte, porém, mais estudos são necessárias para responder algumas questões sobre essa temática.


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